Torino – A tragédia de Superga

O Torino foi fundado em 1906, em Turim, para competir com a Juventus, outro time da cidade. A equipe teve entre seus fundadores membros do extinto Torinense FC e também da rival Juventus, com quem a equipe divide os estádios Delle Api e Olimpico. Hoje o Torino é a 8ª maior torcida da Itália com cerca de 1 milhão de torcedores.

A equipe que já se chamou AC Torino e Torino Calcio, não disputa as primeiras posições com os gigantes europeus, mas já foi considerada a melhor equipe de todo o velho continente. Na década de 40 dominou o futebol italiano e sagrou-se campeã nacional por cinco vezes na década, sendo que já havia ganho o scuddeto na temporada 27/28 e em 42/43 ganhou a Copa e o Calcio, consagrando-se como a primeira equipe a conseguir ganhar os dois campeonatos na mesma temporada.

A temporada de 47/48 foi o auge da equipe: 65 pontos, uma diferença de mais de 15 pontos para o segundo colocado, récorde de gols marcados (125) e maiores goleadas, seja em casa, 10 a 0 na Alexandria ou fora de casa, 7 a 0 na Roma. O Torino não era um time, era uma seleção disfarçada, isso porque era a base da seleção italiana da década. Ocorreram jogos que quando muito, apenas um, ou dois jogadores da Squadra Azzurra não jogavam na equipe de Turim.

Esse sucesso todo estava envolvido em um contexto histórico muito complicado, que era relacionado a reconstrução de uma Itália destruída pela guerra e a superação da classe operária. As vitórias do Torino e da seleção italiana ajudavam a população a esquecer um pouco dos horrores pelos quais passavam.

O Torino da década de 40 jogava no ataque, era apaixonante.

Comandada por Valentino Mazzolla, a equipe encantava o mundo. O maestro Mazzolla regia a sinfonia do ataque de Turim com Menti, Loik, Gabbeto e Ossola, Ringamonti, Grezar e Castigliano. Os zagueiros dançavam nessa sinfonia, até os da própria equipe, que não eram muitos: Ballarin era o cabeça de área e o goleiro era Lupo, ou melhor Bacigalupo, o goleiro que não tomava gols.

Mazzolla e companhia trouxeram um futebol que foi de encontro a tradição italiana, que na época já era uma seleção famosa pela sua defesa. Mas em pouco menos de cinco anos esse estigma foi pulverizado pelos craques de Torino, especialmente Mazzolla, Gabbeto e Ossola.

Mazzolla, que está representado na foto ao lado, era um jogador de classe e marcou sua história na Itália. Foi capitão da Squadra Azzurra e considerado por muitos o melhor jogador italiano daquela década. Era um camisa 10 clássico, como a gente diz nos dias de hoje, de acordo com os maiores jornalistas. No Torino sua identificação era ainda maior e além de ser o capitão e astro da equipe, seu filho,  Ferruccio, tornou-se Presidente do time anos depois.

O supertime italiano ainda teve uma passagem pelo Brasil em 1948 e jogou quatro jogos. Empatou com o Palmeiras em 1 a 1 e com o São Paulo em 2 a 2. Foi derrotado pelo Corinthians por 2 a 1 e conseguiu sua única vitória contra a equipe da Portuguesa, goleando por 4 a 1. Todas as partidas foram realizadas no estádio do Pacaembu. Para o técnico Márcio Speroni, que comandava a melhor equipe do futebol europeu, o saldo foi positivo apesar dos resultados, pois voltaram para a Itália melhores do que chegaram ao Brasil.

Na temporada de 48/49 o time líderou a Série A do começo ao fim e a segunda colocada, Inter, tinha poucas chances perante a superioridade clara da equipe de Turim. Jogava-se a 34ª rodada do Calcio restando apenas quatro para o final e oito pontos em disputa, já que as vitórias valiam apenas dois pontos. O AC Torino liderava com quatro pontos de vantagem para a Inter e estava a duas vitórias de conquistar o quinto Scuddeto consecutivo. Os quatro últimos adversários eram Genova, Palermo, Sampdoria e Fiorentina, sendo que três das quatro partidas em casa.

No dia 4 de maio de 1949, as 17:05, o destino virou para o Torino.

O time foi convidado para uma partida amistosa contra o Benfica, na cidade de Lisboa, que fazia parte das homenagens ao capitão lusitano José Ferreira. O time italiano foi derrotado por 4 a 3, mas essa não foi a maior derrota que o Torino sofreu naquela viagem. Durante a volta para a Itália, o avião que transportava a equipe, um FIAT G212, da companhia Aeroitália, chocou-se com a fachada da basílica de Superga sem deixar nenhum sobrevivente. Eram 31 passageiros, sendo 18 jogadores profissionais do Torino e dez deles faziam parte da seleção títular da Itália, que viria ao Brasil para a Copa de 1950.

Coube ao treinador da Squadra Azzura a dura tarefa de reconhecer os corpos dos jogadores que estavam no avião. Como toda tragédia, existem aqueles salvos pelo gongo e aqueles que insistiram em seguir para o destino. Sauro Tomá com lesão no joelho, que atrapalhou sua carreira posteriormente, não viajou, assim como Kubala que teve um contratempo com o filho. No entanto, o craque símbolo do time e do país, Valentino Mazzolla, insistiu em viajar, mesmo gripado, por ter sido responsável por marcar o amistoso em homenagem ao amigo José Ferreira.

Uma enorme comoção tomou conta do mundo e era simplesmente impossível conter as lágrimas que banhavam a Itália inteira. Foram muitas homenagens ao redor do planeta. No Brasil, o Corinthians jogou contra a Portuguesa vestindo um uniforme grená do time de Turim e venceu por 2 a 0. Já na Argentina, o River Plate jogou diversos amistosos para arrecadar beneficios as viúvas e orfãos das vitimas do acidente.

O futebol italiano ficou tão chocado com o acidente, que a seleção viajou de navio para a Copa do Mundo de 1950, realizada no Brasil. Além disso, a tragédia marcou para sempre o estilo de jogo. A ofensividade da equipe que marcou 125 gols em 40 jogos ficou pra trás, e dez anos mais tarde o futebol italiano já estava totalmente focado no setor defensivo novamente.

No mesmo dia do acidente a equipe foi declarada vencedora da Liga, por honra, pela brilhante campanha que havia feito até então, mas ainda haviam quatro jogos para serem disputados e o Torino não tinha mais o seu super time. Os juniores então assumiram a equipe para as partidas finais e os quatro ultimos adversários, em respeito a tragédia, também mandaram os elencos juvenis para os jogos. Os jovens de Turim venceram o Genova por 4 a 0, o Palermo por 3 a 0, o Sampdoria, fora de casa, por 3 a 2 e por ultimo a Fiorentina por 2 a 0, sagrando-se campeão de honra e também esportivo.

No dia 12 de junho de 1949, após o  jogo da ultima rodada contra a Fiorentina, todos os torcedores e jogadores caminharam até a basílica de Superga. Dizem que eram mais de 20, talvez 30 mil pessoas marchando para o local do acidente. Na cerimômia fúnebre aos jogadores, compareceram mais de 500 mil emocionados fãs.

Com a tragédia o time de Torino ficou despedaçado e mesmo com a decisão de que independentemente do que acontecesse a equipe não seria rebaixada pelos 4 anos seguintes ao acidente, o time não resistiu e caiu para a segunda divisão em 1955.

Só que na década de 60 surgiu um craque. Seu nome era Luigi Meroni, mais conhecido como Gigi Meroni, vinha de Genoa, e havia iniciado a carreira no Como, da segunda divisão italiana. Meroni chegou ao Torino em 65 e colocou a equipe novamente entre as melhores equipes da Europa e sendo a grande esperança da seleção Italiana.

No dia 15 de outubro de 1967, Gigi Meroni foi atropelado por um torcedor fanático do Torino e morreu. O falecimento de Meroni foi a segunda tragédia da história do Torino e abalou, pela segunda vez o time de Turim.

A equipe ainda ganhou o Scuddeto na temporada 75/76, mas não despontou mais e hoje oscila entre a Série B e a Série A do campeonato italiano.

Pra você que tem preguiça de ler, no meu quadro que ia ao ar no programa No Mundo da Bola, da Jovem Pan.

Sobre Gabriel Fuhrmann

Jornalista e radialista, trabalhou por três anos como produtor na Rádio Jovem Pan e na rádio produziu e apresentou quadros como "Um clube e sua história", no qual contava histórias sobre grandes e pequenos clubes do mundo. Foi repórter responsável pela página de basquete do porta iG - Internet Group e estagiário de produção e edição do Arena Sportv.
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